Colocar alimentos quentes no frigorífico: o que diz a ciência?
- Ana Rita Sousa
- 3 de nov.
- 3 min de leitura
Durante anos ouvimos que “não se deve colocar a sopa quente no frigorífico porque azeda” ou “pode estragar o frigorífico”. Mas será mesmo assim? A verdade é que não é o alimento em si que está em risco, mas sim a segurança dos outros alimentos armazenados. Este artigo explica o que realmente acontece, o que recomenda a evidência científica e como garantir uma refrigeração segura.
O que acontece quando colocamos comida quente no frigorífico
Introduzir um alimento quente no frigorífico pode elevar temporariamente a temperatura interna. Esta subida, por pequena que seja, é suficiente para que outros alimentos entrem na chamada “zona de risco” (entre 5 °C e 65 °C), onde as bactérias se multiplicam com maior facilidade.
Nos frigoríficos mais modernos, o sistema de refrigeração consegue compensar rapidamente essa variação. No entanto, em equipamentos mais antigos, cheios ou mal ventilados, esse equilíbrio é mais lento, aumentando o risco de contaminação e deterioração.
A importância de arrefecer rapidamente
Segundo a ASAE (Autoridade de Segurança Alimentar e Económica), os alimentos cozinhados devem ser arrefecidos rapidamente antes de serem refrigerados, para reduzir o tempo passado na zona de risco.
Quando um alimento permanece entre 5 °C e 65 °C durante mais de 2 horas, a carga microbiana pode duplicar várias vezes, favorecendo o crescimento de microrganismos como Salmonella, Listeria monocytogenes ou Bacillus cereus.
Assim, o ideal é que os alimentos cozinhados não permaneçam à temperatura ambiente mais de 1–2 horas antes de serem guardados no frigorífico.
Como arrefecer os alimentos em segurança
A forma mais eficaz de prevenir riscos é arrefecer rapidamente o alimento após a confeção. Eis algumas estratégias seguras:
1. Dividir em porções menores
Porções pequenas arrefecem mais depressa e de forma uniforme. Usar recipientes rasos ou largos acelera o processo.
2. Mexer ocasionalmente
Misturar suavemente ajuda a distribuir o calor de forma homogénea, evitando que o interior se mantenha quente por demasiado tempo.
3. Utilizar um banho de água fria
Coloca o recipiente bem fechado dentro de outro com água fria ou gelo. Esta técnica é particularmente útil para sopas, caldos e molhos.
4. Guardar apenas quando estiver morno
O alimento não precisa estar totalmente frio, mas deve deixar de libertar vapor intenso. Quando estiver morno ao toque, pode ser colocado no frigorífico sem risco de aquecer o ambiente interno.
Organização e boas práticas de conservação
Garantir que o frigorífico está bem organizado é tão importante quanto o próprio arrefecimento:
Mantém a temperatura abaixo dos 5 °C.
Não sobrecarregues o frigorífico: o ar frio deve circular livremente.
Coloca os alimentos cozinhados nas prateleiras superiores, longe de alimentos crus.
Usa recipientes herméticos e identifica com data de confeção.
Verifica periodicamente a temperatura com um termómetro.
Estas práticas reduzem o risco de contaminação cruzada e prolongam a durabilidade dos alimentos.
O que diz a evidência e as entidades oficiais
De acordo com a ASAE, os alimentos quentes não devem ser guardados diretamente no frigorífico. Antes disso, devem ser arrefecidos rapidamente, idealmente dentro de 90 minutos.
Outras entidades internacionais, como a Food Standards Agency (Reino Unido) e a European Food Safety Authority (EFSA), reforçam que a zona de perigo térmico (entre 5 °C e 63 °C) é onde as bactérias crescem mais rapidamente.Reduzir o tempo que os alimentos permanecem nesta faixa é uma das formas mais eficazes de prevenir intoxicações alimentares.
Perguntas frequentes (FAQ)
É seguro colocar sopa quente no frigorífico? Não. O calor libertado pode elevar a temperatura interna e afetar a segurança de outros alimentos. É preferível deixar arrefecer até estar morna (1–2 h).
Quanto tempo posso deixar a comida fora antes de refrigerar? Idealmente até 2 horas, ou menos em dias quentes. Após esse período, aumenta o risco de multiplicação bacteriana.
Posso tapar a comida enquanto arrefece? Sim, mas com a tampa entreaberta, para permitir a libertação do vapor. Assim evita-se condensação e crescimento bacteriano.
E se colocar diretamente por falta de tempo? Se for apenas uma pequena porção num frigorífico moderno, o impacto é limitado. No entanto, não deve tornar-se uma prática habitual.
Conclusão
Arrefecer corretamente os alimentos antes de os colocar no frigorífico é uma prática essencial de segurança alimentar. Mais do que proteger o próprio alimento, evita que outros se deteriorem e reduz o risco de infeções alimentares. Com alguns cuidados simples: dividir em porções, mexer, usar água fria e garantir ventilação adequada, é possível conservar as refeições de forma segura, prática e eficaz.
Referências
Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE). Conservação dos alimentos no frio. Disponível em: asae.gov.pt
Food Standards Agency (UK). Temperature control in food safety.
European Food Safety Authority (EFSA). Safe food handling practices.
RSPH (Royal Society for Public Health). Cooling and reheating food safely.
Artigo revisto e redigido por Ana Rita Sousa, Nutricionista




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